“Retroatividade de lei sobre prazo para registro de armas é tema de repercussão geral

O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a existência de repercussão geral na matéria tratada no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 674610, em que se discute a extinção ou não da punibilidade do delito de posse irregular de arma de fogo de uso permitido, em razão da aplicabilidade retroativa de lei que concedeu novo prazo para registro de armas.
No caso concreto, um lavrador foi denunciado em 2007 pela posse ilegal de seis armas de fogo e munição e condenado pelo juízo da Comarca de Corumbá de Goiás pelo crime do artigo 12 da Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento). O prazo inicial para que os proprietários de armas ainda não registradas solicitassem o registro (artigo 30 do Estatuto) era 23/6/2005. Duas normas posteriores, porém, estenderam esse prazo – a Medida Provisória 417, convertida na Lei 11.706/2008, com prazo até 31/1/2008, e a Lei 11.922/2009, até 31/12/2009.
O Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO), ao julgar apelação, extinguiu a punibilidade do réu com o entendimento de que sua conduta estaria abrangida pela Lei 11.922/2009, ou seja, ele ainda estaria dentro do prazo para regularizar o registro das armas.
Contra essa decisão, o MP-GO interpôs o recurso extraordinário ao STF, alegando que as normas em questão não constituem abolitio criminis (abolição do crime), porque foram editadas como medida “despenalizadora” destinada a permitir a regularização da posse ilegal de armas no curso de sua vigência.
Normas
O relator do processo, ministro Luiz Fux, esclareceu que a discussão jurídica no recurso diz respeito à tipicidade da conduta de posse irregular de arma de fogo de uso permitido ocorridas entre o prazo inicialmente previsto no estatuto e os demais prazos estabelecidos pelas normas posteriores. “A reabertura do prazo para registro ou renovação implica abolitio criminis [abolição do crime] em relação àqueles que estavam irregularmente na posse de arma de fogo após 23/6/2005?”, indaga o ministro.
De acordo com o relator, desde a redação original do Estatuto do Desarmamento, “nunca houve previsão explícita de abolitio criminis, ou mesmo de que a eficácia do artigo 12 da lei estaria suspensa temporariamente”. Ele esclareceu que “a doutrina e a jurisprudência, mediante interpretação sistêmica, concluíram que, no prazo assinalado em lei, haveria presunção de que o possuidor de arma de fogo irregular providenciaria a normalização do seu registro (artigo 30) no prazo legal”.
Manifestação
Segundo o ministro, encerrado prazo legal para a regularização das armas até 23/6/2005, “passou a ter plena eficácia o crime de posse de arma de fogo de uso permitido previsto no artigo 12 do estatuto”. No seu entendimento, nos períodos de 24/6/2005 a 30/1/2008 e de 1º/1/2009 a 13/4/2009, o possuidor de arma não poderia providenciar a regularização do seu registro nem alegar boa-fé ou invocar em seu favor a adoção de providências nesse sentido. “Na prática, isso não seria possível, ante o encerramento do prazo para tal”, assinalou.
Ao apontar a existência de repercussão geral na matéria, o ministro afirmou que “é incabível cogitar da retroatividade da Medida Provisória 417 para extinguir a punibilidade do delito de posse de arma de fogo cometido antes da sua entrada em vigor”, devido à impossibilidade da regularização do registro quando da prática do crime. Posicionou-se, assim, pela aplicação de jurisprudência do Supremo no sentido da irretroatividade do prazo previsto na Lei 11.706/2008, citando, entre outros precedentes, o Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 111637, de relatoria do ministro Ricardo Lewandowski, e o HC 96168, de relatoria do ministro Eros Grau (aposentado).
Com tais fundamentos, o ministro, depois de reconhecer a repercussão geral da matéria, manifestou-se pela reafirmação da jurisprudência desta Corte e pelo provimento do RE “para considerar penalmente típicas as condutas de posse de arma de fogo de uso permitido ocorridas após 23/06/2005 e anteriores a 31/01/2008”.
Em deliberação no Plenário Virtual da Corte, os ministros, por maioria, reconheceram a existência de repercussão geral da questão suscitada, mas, no mérito, não reafirmaram a jurisprudência do Supremo sobre a matéria. Assim, a questão será submetida, oportunamente, a julgamento pelo Plenário do STF.
DV/AD”



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